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Sobre o amor de mãe e o desespero

Escrito por Dani Kmiec

Tem gente que tem bicho de estimação. E tem gente que é mãe (ou pai) de bicho de estimação. E esse amor é um dos mais puros que a gente pode encontrar por aí.

dani_oliverDizem que só descobrimos a mãe dentro de nós a partir do momento em que nos tornamos mães. Pois olhe, tenho que concordar.

Uma pesquisa feita na Universidade de Melbourne revelou que o laço materno com o seu cachorro é causado pelo “hormônio do amor”, a ocitocina. Naturalmente, cães e humanos produzem maiores níveis desse hormônio quando interagem, fortalecendo os laços e os tornando semelhantes aos laços de mãe e filho. Quem conhece meu cachorro sabe o quão doce, parceiro e zoeiro ele é. Afinal, o que se pode esperar de um cachorro de quase dois anos que não sabe nem rosnar e tem medo de tiros em filmes?

Esta semana, o Oliver resolveu fazer um teste para cardíaco comigo, e aparentemente, comeu veneno de rato. Então agora, vou contar pra vocês uma breve — nem tão breve — história de desespero, choro e tremedeira.

Eram umas 21h quando minha mãe ligou, e como sempre, não ouvi o celular tocar ou vibrar. Mas logo em seguida, retornei a ligação esperando gritos e desespero porque não coloquei o lixo pra fora. Ledo engano, ela havia ligado para me desesperar: Danielle, Oliver comeu veneno para ratos, o que a gente faz?

Não sei o que aconteceu na hora, mas precisei ter algum embasamento antes de tomar uma atitude, aí entrei no Google e comecei a ler sobre intoxicação por venenos de rato e: todos os artigos terminavam em morte. Levantei já tonta, com ânsia e tentando segurar o choro, e fui pra casa transtornada pronta pra ver a desgraça.

Quando abri a porta, lá veio o brutamontes mais desengonçado, escorregando de lado no piso de madeira – por conta dos pés peludos -, com a boca aberta e olhos apertados, como se sorrisse porque a mãe chegou em casa. Estava tudo bem, aparentemente. Tudo que consegui fazer foi sentar no chão e chorar, enquanto esbravejava um sincero “seu bosta, nunca mais faça isso, pare de me assustar” e também agradecia por ele estar bem. Entre lágrimas, vi o desespero dele ao me ver tão triste, lambendo meu rosto e trazendo bolinha e bichinhos de pelúcia para brincarmos.

Enxuguei as lágrimas e fui à farmácia comprar carvão ativado, que teoricamente absorve a substância tóxica e diminui a quantidade disponível para absorção pelo sistema digestivo; eu seja, inibe a ação do veneno. Aí, o namorado levantou a questão: como você pretende dar o remédio pra ele? Essa bicharada não gosta de remédio — disse o cat person. Minha resposta foi bem simples: ou ele come numa boa, ou enfio na goela, seguro o fuço e espero ele engolir pra soltar. No fim, Oliver comeu o carvão, achando que era uma espécie de TicTac preto, e foi tomar água, todo serelepe.

Antes de tomar uma providência mais séria — levá-lo ao veterinário — reconstituímos a cena do crime para ter certeza de que ele não comeu o veneno. E bingo!, meu cachorro é tão destruidor que só fez questão de desmontar o veneno para fazer um teste de cardíaco comigo e com a minha mãe. Mesmo assim, seguimos preocupadas, e de olho em qualquer alteração na criatura: olhos vermelhos, coração disparado, pupila dilatada, e não havia nada fora do comum.

Nossa noite teve um sono inquieto, teve oração pra todos os orixás e santos disponíveis, teve sonho com rato. Só não teve paz.

Se ter filhos é esse desespero 24/7, tô começando a não querer. Mas tenho certeza que o instinto materno já foi despertado. Talvez não só isso, mas o apego, a amizade sincera que esses bichanos trazem. O amor que sinto pelo Oliver com certeza veio de outra vida, porque o brilho no olhar, o comportamento, a coisa mais besta tipo ele me puxar com a pata ou colocar a cabeça no meu braço enquanto digito esse relato, não é o retorno só por colocar ração e afagar suas orelhas peludas. Hoje, sei que ele me escolher foi um acerto sem tamanho e agradeço todo dia por tê-lo por perto.

Jamais havia sentido um amor tão puro, sem cobranças, sem desentendimentos — exceto quando ele resolve roubar um sutiã, meias ou as pantufas da “avó”. É chegar em casa depois de um dia cansativo e saber que alguém te receberá sorrindo, genuinamente feliz, e com um abraço reconfortante… É nunca mais poder ir ao banheiro de porta fechada, porque a parceria é pra todas as horas. É ter amor incondicional durante toda a (curta) vida dele. É aproveitar todo esse amor durante a vida.

“Eles vivem menos porque nascem sabendo amar de uma forma que levamos a vida inteira para aprender.”

Sobre o autor

Dani Kmiec

Fazedora de várias coisas ao mesmo tempo, especialista em conselhos furados e dona de um dicionário informal cheio de palavras emaranhadas pela dislexia. Parceira de cerveja, entusiasta do falatório e das boas risadas na mesa do bar comendo pão com bolinho. Vesga, mal humorada, esquecida, dona do humor #000000, piadinhas sem graça e... que que eu tô fazendo aqui mesmo?