Eu tenho certa dificuldade em aceitar o passado como algo que não posso mudar, admito. É claro que a vida ensina e algumas vezes, eu penso que, apesar das cagadas, o conjunto das coisas me trouxe pra perto de onde eu queria estar ou próximo do caminho que tende a me levar pra onde quero ir. Mesmo assim , tenho a sensação de que volta e meia meus pensamentos empacam em um “big if”.
Se não ganha jogo, se minha mãe tivesse rodinha eu seria uma bicicleta ou, sendo um pouco menos popular, ninguém pode voltar atrás e escrever uma nova história, mas todos podem fazer um novo final. Essas passagens são ótimas, mas não me convencem e isso não tem nada a ver com infelicidade. O que me mata nesses casos é a curiosidade.
Poucas curiosidades matam mais do que a sensação daquilo que não foi. Certo dia, fui provocado a escrever esse texto. Analisava cada relação que já tinha vivido ou acompanhado, e pensava no desdobramento de cada uma delas, ou das mais marcantes, não sei.
Como seria um envolvimento com aquele amor de criança que a distância impediu? Como seria a vida se eu tivesse me apaixonado por logística? Se eu não tivesse batido o carro aquele dia? Escolher o tema mais interessante não foi difícil, ainda que isso não tivesse nada a ver com meu estado de espírito. O coração anda bem melhor do que o que seria normal e tenho caminhado feliz.
Mesmo assim, resolvi insistir nessa viagem curiosa, sobre o amor de criança, que virou admiração, respeito, bem querer e às vezes, várias vezes, um querer maior do que deveria. Não é uma sensação avassaladora, irresponsável, incontrolável, daquelas que te faz querer jogar tudo pro alto. Não diminui a importância daqueles que estão em nossas vidas, mas deixa no ar uma vontade imensa de sentir o verdadeiro sabor daquilo que apenas vemos e sentimos o cheiro.
Mais do que ver, sentir o cheiro e acompanhar, estivemos por perto quase sempre, acompanhamos o desenvolvimento um do outro, sorrimos os risos, choramos os choros e acalmamos nossos corações com as conquistas e felicidades da vida daquela pessoa amada, até mesmo quando isso envolvia a busca de uma relação boa e saudável com um outro amor.
Acho que talvez o histórico seja o problema, a quantidade de tempo envolvida e o que éramos quando tudo começou. É possível que seja a idealização da infância, com a admiração pelo resultado na vida adulta, não sei. Se nosso envolvimento tivesse acontecido mais tarde, quem sabe tivéssemos matado parte dessas vontades e hoje a curiosidade não nos matasse da mesma forma, quem sabe fosse menor e um pouco menos assustadora.
Às vezes parece que se tentássemos resolver isso em alguns momentos entre quatro paredes serviria, mataríamos as curiosidades mais profundas e superficiais. Só acho que talvez faltasse o meio do caminho, talvez faltasse o ser um do outro de verdade e por mais tempo, mesmo que ninguém queira mudar sua vida por isso, abandonar relações bonitas e bem estruturadas, essa relação é tão bonita e sincera quanto insana.
Minha imaginação é frequentemente testada e às vezes eu queria só ter a coragem de ter um pedacinho disso tudo, mesmo que por alguns instantes, mesmo que fossem apenas as curiosidade mais profundas e superficiais. O problema, digo por experiência própria, seria um efeito até provável, de nos comportarmos como fogo e gasolina.
Seguimos amigos, torcendo um pelo outro e nos bem querendo, cada vez mais.