Amor é prosa Tempestade de Cérebros

O circo do coração

Escrito por Dani Kmiec

Hoje, me sinto o palhaço. Um ser esforçado para manter o sorriso no rosto, embora o coração esteja em frangalhos. Porém almejando ser a equilibrista com suas roupas sensuais que conquistam o público a cada manobra arriscada mas friamente calculada, junto à suave tromba do elefante que é acariciado e abraçado pelas crianças ao final do espetáculo.

Uma ida ao circo começa quando compramos um pacote de pipoca e nos acomodamos confortavelmente na arquibancada de madeira para assistir ao espetáculo.

Os jogos de luzes seduzem, fazendo tudo parecer tão bonito, tão rico, a maquiagem dos trapezistas chama atenção no alto dos seus trinta metros de altura, o ilusionista com sua capa da invisibilidade aparece e logo desaparece em um dos lados da lona; a equilibrista recepciona os convidados com uma maravilhosa roupa cheia de brilho e um elefante que acena suavemente com sua enorme e pesada tromba. Ah os leões, tão belos e nervosos com o aglomerado humano em volta, dentro de uma minúscula jaula chegam trazidos pelos palhaços e suas fantasias espalhafatosas com sapatos que eu certamente tropeçaria. Os motores dois tempos do globo da morte são aquecidos e a lona é tomada pelo fragos das motocicletas e pelo cheiro de óleo.

Nosso coração é um circo.

Passamos por inúmeras sensações ao longo da vida amorosa, desde o descobrimento dos sentimentos até o fim de um relacionamento que nos deixa em frangalhos. O flerte é comprar o ingresso, pegar a pipoca é aguardar a entrada do desfile lona adentro.

O elefante, ah o elefante! Mostra suas habilidades equilibristas em cima de uma minúscula bola de borracha enquanto com tanta suavidade agita as majestosas orelhas e tromba a fim de conquistar o público pela fofura. Bruto e delicado, como uma paixão arrebatadora que nos amolece as pernas e nos faz sorrir para a primeira notificação no celular.

O rugido forte dos leões assusta e amedronta os espectadores, como a primeira briga com alguém que você ama. A pelagem é de coloração castanha, e são cheios de hábitos noturnos e crepusculares, ansiando por algo que valha a pena ficar acordado, e descansando a maior parte do dia.

Os palhaços, seres cômicos que provocam o riso, também são os mais tristes, cobertos por várias camadas de maquiagem, que com esforço alegram seu semblante, dando ainda uma atmosfera sombria ao personagem e afastando as crianças que chegam ansiosas pelos balões em formato de girafa.

Os trapezistas, tão belos e pequenos lá no alto da lona, cada manobra é ensaiada perfeitamente e o frio na barriga atinge a todos quando apenas uma mão é pega no ar, no voo mágico entre um trampolim e outro. São as borboletas no estômago, são a emoção da incerteza regada à emoção da queda, que por sua vez será amparada pela rede de contenção próxima aos amigos no solo.

Hoje, me sinto o palhaço. Um ser esforçado para manter o sorriso no rosto, embora o coração esteja em frangalhos. Porém almejando ser a equilibrista com suas roupas sensuais que conquistam o público a cada manobra arriscada mas friamente calculada, junto à suave tromba do elefante que é acariciado e abraçado pelas crianças ao final do espetáculo.

A platéia reflete bem o querer passar do tempo, a vontade de poder olhar pra trás e perceber o quanto crescemos, as dificuldades que passamos e os momentos de glória e emoção do espetáculo. Já volto, vou buscar mais pipoca.

Sobre o autor

Dani Kmiec

Fazedora de várias coisas ao mesmo tempo, especialista em conselhos furados e dona de um dicionário informal cheio de palavras emaranhadas pela dislexia. Parceira de cerveja, entusiasta do falatório e das boas risadas na mesa do bar comendo pão com bolinho. Vesga, mal humorada, esquecida, dona do humor #000000, piadinhas sem graça e... que que eu tô fazendo aqui mesmo?