Poucas coisas são tão ou mais bonitas do que o brilho nos olhos de quem foi arrebatado por uma paixão. Não é um brilho qualquer, é aquele brilho. Olhos de cristal, sorriso torto e quase sempre indiscreto. Por mais que tentem esconder os dentes, eles surgem rapidamente sempre que uma lembrança, uma confidência ou certa pessoa se aproxima.
Os olhos não negam. Nunca! Ao contrário dos dentes, não conseguem ser escondidos, só não ficam expostos quando se fecham. E se fecharão. Seja por prazer ou como mero instrumento de um encontro igualmente gostoso, numa noite de sono e sonhos com a luz daqueles olhos.
Melhor é viver algo assim, mas notar esses efeitos nos outros também conforta. Acompanhar alguém que ganha pra si essa paz que desinquieta é um privilégio. A cumplicidade, o carinho, o medo, a expectativa, a confusão e, tantas vezes, as barreiras.
A paixão não pede licença. Virando amor ou não, ela é força da natureza, chega a ser inútil lutar contra. Eu diria que é bobo lutar contra, mas bobo mesmo é como ficam os apaixonados. Evitar esse tipo de manifestação deveria ser um crime.
Só não me venham com aquele papo de que é possível se apaixonar por alguém todos os dias, o amor vem depois! Estou aqui falando dessa loucura que faz a gente perder o sono e o fôlego, que nos faz lembrar que a vida vai bem além de respirar e pagar boletos.
Uma paixão é como organizar a vida através da bagunça que alguém promove. É como passar a respirar pela falta de ar. É se sentir mordido por um beijo ou deliciosamente beijado por uma mordida. A desorganização da paixão é a antítese da vida projetada pelo comercial de margarina.
Com tantos predicados controversos, fica mais fácil entender quando ela parece imprópria ou inadequada, ela é assim por natureza. Parece que quanto mais imprópria ela é, mais se apresenta como paixão.
Por isso, na minha humilde opinião, não cabe julgamento a uma paixão. Mais do que qualquer coisa, as paixões têm a minha sincera e profunda admiração. Talvez carreguem também um pouquinho de inveja boa.
Que os apaixonados contem sempre com a cumplicidade daqueles que admiram as pessoas e seus olhos de cristal. E que eles tenham a força para conduzir esse processo e arrumar essa bagunça que causam uns aos outros, como se fossem deliciosos furacões.
Deixem-se bagunçar. Vocês já estão mordidos mesmo.