Divã-neando

Quem se doa por inteiro é quem mais precisa de doação

Escrito por Brunno Lopez

Não se doa por completo, não se oferece o infinito do que se é para a realização de vontades terceiras.

Quando se atravessa a avenida da empatia, a alameda da gentileza e a rodovia da caridade, chegamos a um cinema com apenas uma poltrona, onde, sem pipoca e refrigerante, assistimos ao nosso fim.

O exagero em ajudar – tirando partes vitais de nós mesmos para preencher necessidades supérfluas do outro – acaba nos expulsando do nosso próprio corpo, partindo convicções e histórias em pedaços impossíveis de colar.

Não se doa por completo, não se oferece o infinito do que se é para a realização de vontades terceiras. Não se despedaça a si para sobrar no outro, não se quebra o essencial para se transformar no enfeite de alguém.

Abrir mão é fechar-se para a completude. Se você escolhe transferir os lucros de uma vida para a conta de uma aventura, o único resultado é a falência. Distribuir recursos vitais é cometer pequenos suicídios morais.

Quando a doação é inteira, você está pagando à vista. E com a vida.

Sobre o autor

Brunno Lopez

Um ilustrador de palavras que é a favor de tudo que é do contra. Um publicitário que não faz propaganda.
Um otimista aposentado que dá um tapa nas costas da vida enquanto o resto do mundo a empurra existência abaixo.
Um compositor de letras cotidianas sob um violão desafinado.
Um desenhista de verbetes que tem muitas certezas sobre as próprias dúvidas e acredita que o amor não passa de um tapete mágico que sobrevoa as misérias humanas.