Correspondência Divã-neando

O que eu gosto em mim

Escrito por Rose Carreiro

Faz uns meses, minha psicóloga me deu a única tarefa desses anos de terapia que eu sequer havia conseguido começar: escrever sobre o que eu gosto em mim. 

Já tive que fazer listas, que escrever sobre dores, descrever vantagens e desvantagens; coisas que eu queria fazer, coisas que eu não deveria mais aceitar. Mas, escrever sobre o que eu vejo como minhas qualidades ficou de lado. Talvez porque eu não estivesse em condições de me olhar desse jeito nos últimos tempos. Ou porque eu procrastino aquilo que eu não quero fazer quando se trata da minha vida pessoal. O projeto final da faculdade que o diga.

Só que uma coisa da qual eu gosto em mim é que eu gosto de escrever. E faz dias que eu tenho sentido vontade de publicar algo aqui. Por que não usar, então, esse algo que eu gosto em mim pra falar de outras coisas que eu gosto em mim?

Gosto do meu humor. De incluir referências de The Office, piadas autodepreciativas, sagacidade e duplo sentido. Talvez seja a característica que mais me ajuda ou atrapalha, mas com a qual eu melhor me sinto, ainda que às vezes não seja exatamente compreendida pelos outros. 

Gosto de ser insistente. Dificilmente eu desisto de algo que eu quero, e quando eu não quero mais, também sou boa em demonstrar isso. Isso pode ser confundido com ser fácil ou teimosa. Ao menos, eu não deixo dúvidas: se eu quero, você vai saber. Se eu não quero, também. 

Gosto da minha criatividade. De entrar na espiral da loucura das ideias e não deixar a cabeça parar. Criar me faz sentir que sou útil e que posso fazer a diferença. E escrever é uma das minhas formas de criar. 

Gosto de ser independente. Por mais que eu me sinta sozinha e queira alguém que cuide de mim às vezes, é bom saber que eu posso me virar, que não vou morrer de fome e que não vou deixar de ir a lugar nenhum por falta de companhia.

Gosto de ser sonhadora. Fantasiar me ajuda a fugir quando tudo dói demais, mas também me ajuda a imaginar mundos e ser otimista.

Gosto de ser intensa. De me aprofundar nas relações, no trabalho, de não ficar na distância segura, de ver o fogo queimar, de não ser morna.

Gosto de não ter vergonha de me expor. É assim que eu danço sem saber, que eu falo com estranhos e conheço pessoas, que eu me comunico numa língua que não é a minha, num lugar que não é o meu lar. E é assim que eu escrevo aqui sobre experiências extremamente pessoais. 

Gosto de gostar de gatos, de saber cozinhar, de ser safada, de ser sensível, de aguentar o tranco, de encarar o trabalho chato, de não ter medo de desafios, de querer sempre mudar, de não me arrepender do que eu faço.

E, principalmente, gosto de ser capaz de  exprimir o que eu sinto. Sou transparente como a água, péssima em esconder como as coisas me atingem, fácil de ser lida com um olhar. Vantagem e desvantagem, mas eu gosto de ser assim.

Pensar e falar sobre si é um buraco difícil de cavar, mas ajuda a fazer com que a gente se lembre de quem é e do nosso valor. Por isso, esse texto não tem uma conclusão, mas termina com uma pergunta: o que você gosta em você?

Sobre o autor

Rose Carreiro

Nascida num 20 de Outubro dos anos 80. Naturalmente petropolitana, com passaporte carioca. Flamenguista pé frio e expert em não se aprofundar em regras esportivas. Fã de Verissimo – o Luis Fernando – e Nelson, o Rodrigues (apesar de tudo). Poser. Pole dancer com as melhores técnicas para ganhar hematomas. Amadora no ofício de cozinhar e fazer encenações cômicas baratas. Profissional na arte de cair nos bueiros da Lei de Murphy.

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