Embora eu esteja indo embora, a pretensão natural que veste meu orgulho gosta de pensar que as palavras ainda vão ficar aqui por um tempo. Cada letra foi uma gota salgada de suor, temperando dias insípidos de alguém. Às vezes, elas ficavam presas entre carpo e metacarpo, escondidas em terminações nervosas do pulso, numa seleção muscular de qualidade até que tivessem força e relevância suficientes para desfilarem confiantes diante dos olhos julgadores de uma sociedade que não sabe ler. Mas sabe opinar.
Embora eu esteja indo embora, enrijeci os músculos ao máximo para deixar marcas que o sol não esmaeça. Uma tatuagem feita com tintas do tipo 0 -, raras e vitais para que combatam o menor sinal de esquecimento. Talvez os dias atuais tenham produzido uma hemorragia e é perfeitamente aceitável perecer despejando convicções valiosas sobre este deserto de literatura contemporânea. Porém, um oásis não é suficiente pra quem está acostumado com oceanos de água doce e nanquim.
Embora eu esteja indo embora, reforcei as costuras da minha mochila pra tentar levar os predicados e imperfeições de todos vocês. Lembrar é sempre mais difícil do que conviver, mas existem desejos individuais escandalosos, que gritam mais alto que o discurso daqueles que mais gostamos — ou apenas toleramos por protocolos sociais. Se a intimidade é uma assassina de expectativas, é sábio deslizar ileso enquanto somos admiravelmente estranhos uns aos outros.
Embora eu esteja indo embora, assim como um bumerangue ou uma justiça divina, talvez eu volte, um dia, pra cada um de vocês.
Quero acreditar que estará alçando vôos maiores. E que o bumerang volte para casa, mesmo que ela não seja aqui.