Relatório de Evidências

Resolução Fitness nº 2017

Escrito por Nathalia Karl

Quando penso em ser fitness (leia-se fiti-nés), me brota da pélvis um projeto piscando como um céu de luz neon. Mas, ante a impossibilidade técnica de ser um projeto de renome quase que com incentivos fiscais como um “projeto bumbum na nuca”, criei um mais intimista, de vanguarda por assim dizer, menos chamativo, mais recreativo e sem pretensões de sucesso nas redes sociais. Seguinte: “Projeto Chacrete”, cujo objetivo é apenas poder caminhar com a dignidade de um pudim de boa consistência pela orla de Copabacana, ostentando um maiô onçado mais cavado do que o túmulo de Tutancâmon. 

Para isso, me inscrevi no crossfit, mas não deu certo. A experiência deixou relatos marcantes, a serem eternizados no livro das histórias apoteóticas das atividades físicas pelo globo terrestre. Posso resumidamente dizer que, quando lá estive, me sentia como o quinto cavaleiro do apocalipse, um prenúncio vivo e pulsante da desgraça alheia, mas, ainda assim, não discordo que seja uma atividade com diversas virtudes tônicas. Não encontrei meu eu lírico atleta por ali, não vinguei no crossfit, mas fiz amizades e, claro, dei trabalho para as pessoas.

Quase que fazendo cultos ecumênicos diários no fundo de casa para que brotasse em mim o encosto do espírito entusiasta que pega esse povo que frequenta academia, me dei uma nova chance e me matriculei na academia que, de tão retrô, apelidei de academia do tétano. Estava indo razoavelmente bem, embora a minha falta de talento nato para atividades físicas seja berrante. Lá, consegui aprender a caminhar na esteira com as mãos soltas, e quem rir disso vai receber a praga do “no pain, no gain”, então, receba!

Obviamente, essa situação não se sustentou e eu desisti da academia do tétano, dessa vez sem colecionar novas amizades e sem causar adversidade para os profissionais da área. Um marcante zero a zero no jogo da minha vida.

Embora estivesse às raias de uma nova decadência física, quis o destino que o mês fosse junho e as fotos na rede social fossem do cara mais infame da minha convivência, o Eduardo Mazzeu, que é como ele se apresenta na sociedade moderna. Vi fotos desse cara malhando, tão imbuído, tão dedicado às causas bíceps e tríceps, que eu pensei: hoje é um novo dia, de um novo tempo que começou.

Mandei mensagem para Dudu, que tão convicto como um depoente da CPI do Whey Protein, me convenceu com seu “vem pra cá” embebido em catinga de suor, e com mais rapidez e propriedade do que 50 minutos de propaganda daquele moço do paletó azul.

Realmente, ou finalmente, eu consegui conciliar harmoniosamente as minhas pretensões com o objetivo da academia, com os profissionais, e socializar com meus novos colegas de bancada fit, sem necessariamente conversar somente sobre variações de receitas de batata doce, clara de ovo, frango e tamanho de músculos. Trocamos diversas receitas de dietas do Imprudentes do Volume e outras denominações quase religiosas e pagãs; mas para ninguém achar que eu atingi o nirvana e a vida atlética me afagou, eu já digo, lá tem coisa que eu não gosto. Por exemplo: aquelas caixas denominadas por mim de “caixa tira tampo de canela”, que eu rezo para terem infestação de cupim, mas repenso quando o Thales chega e fala aleatoriamente para o bebedouro quase no tom de voz de Gandhi, pregando extremamente humanitário: “a bunda é sua, né?”. O remorso me invade, a carapuça serve e fim. Vou. Faço. Sem reivindicações. É preciso ter acima de tudo consciência (corporal).

Saibam todos que, em essência, sigo me autodoutrinando e, tal como disse Machado de Assis em Memorial de Aires: “Deixo aqui esta página com o fim único de me lembrar que o acaso também é corregedor de mentiras. Um homem que começa mentindo disfarçada ou descaradamente acaba muita vez exato e sincero”. É o meu caso e até o fechamento dessa edição, encontro-me matriculada, em dia com o carnê do baú e frequentante de assiduidade média, em busca incansável por bons hábitos para manter a saúde física e mental e, quiçá, concluir com êxito o meu projeto chacrete.

E vocês devem estar se perguntando: “E o Dudu?” Pois é, nunca mais vi nas dependências da academia, nem por anexos fotográficos nas redes sociais, e o único shake que eu sei que ele tá tomando é o Milkshake do fastfood que fica nas adjacências da escola de idiomas dele. Falo mesmo.

Sejam felizes, sejam saudáveis, tirem várias selfies de barriga encolhida e mandem nudes, afinal diz o estribilho de conhecida canção de nossa musa nacional Rita Cadillac: “é bom para o moral”.

Beijos, sem glúten.

 

Sobre o autor

Nathalia Karl

Nathália é uma vítima de suas próprias frases mal alinhavadas que lhe rendem um retrato falado que não corresponde a realidade.
Está lançado o desafio: Se não gostarem, processem-me.