u·ma·mi |umàmí| substantivo masculino
Sabor delicioso ou agradável que constitui um dos cinco sabores básicos, a par do doce, do salgado, do amargo e do azedo.
Dicionário Priberam da Língua Portuguesa 2008-2013
Dada a definição de umami, reflito aqui sobre as coisas e pessoas que abundam ou carecem desse gostinho.
Sabe quando você tem um dia que parece ter passado em branco, pode até ter sentido uma emoçãozinha aqui ou outra ali, mas não é nada que te faça deitar a cabeça no travesseiro e pensar sobre o que houve? Faltou umami. Ou quando você vê aquela pessoa linda, de traços simétricos, cabelos perfeitamente ajeitados, 200 dentes brancos num sorriso que não tem nenhum franzidinho de idade, mas que é só mais uma beleza genérica? Bota Ajinomoto, porque é ausência de umami.
Às vezes acontece de eu ler um texto, ou um livro, ou vejo um filme enquanto zapeio entre aquele monte de canais HBO que não servem pra quase nada mais, agora que acabou Game of Thrones, e termino sentindo que gastei tempo de vida. Serve pra distrair a mente, dar umas lidas no Twitter entre um pedaço e outro da história, mas assim como um bom prato de alface, não é nada que mude a minha vida. Alérgicos a intensidade, se vocês se depararem com obras assim, podem consumir, porque não tem umami.
Mas o doce e o amargo da vida também são acompanhados de momentos tão intensos de significado, ainda que por pequenos gestos ou conquistas, que parecem que você comeu um prato de cebola (contém umami, por sinal), e você vai sentir o gosto deles por muito tempo. E eles vêm com aquele gostinho de “quero mais”, sempre. Essa salivação é o que eu classifico como um legítimo caso de umami.
Assim como os momentos e as comidas umami, volta e meia me deparo com uma crônica ou um conto que me dão o que Claude Troigros chamaria de um punch. Um filme que me faz rir, chorar, e desejar que não acabe quando sobem os créditos. Uma série que me deixa miserável, ou que me faz refletir sobre o universo e tudo o mais. O Melhor das Comédias da Vida Privada. É a arte umamizada.
Há, por fim, as pessoas que possuem esse umami. Não se trata de beleza, de cultura ou de sex appeal (ou pode se tratar também, depende de como você saboreou esse tempero). Acontece de você olhar pra alguém e ficar se perguntando o que tem ali? Um trejeito, um sotaque, uma barba desalinhada… Um humor. Um tom de voz. Uma frase tão perspicaz quanto aquela garfada no vatapá que pega o camarão. Pessoas que agradam, com quem uma conversa sempre pode se estender, que mudam a estática do ambiente em que se encontram. Pessoas que vão além de serem doces ou azedas – pessoas que vêm intensas.
O melhor dessa explosão de sabores na nossa existência é que alguém ou algo que pode ter umami pra mim, pode não ter pra você – apesar de haver um senso comum universal que define tomate, Luis Fernando Verissimo e Alessandra Negrini como os maiores concentradores de umami por grama (ou página, ou frame, meça como lhe aprouver). O importante é que, tal qual glutamato, elas realçam o sabor do nosso cotidiano. Então, se você reconhece esse gostinho em pessoas, momentos, em coisas, em arte, deguste cada golinho e se lambuze. Porque umami na vida é que nem preliminar no sexo: tem que ter.
Créditos da imagem: Roychan Kruawan - Unsplash