Pensamentos crônicos

Areia

Escrito por Mayara Godoy

Uma das mais valiosas lições da vida se aprende ainda na infância, construindo castelinhos de areia na praia.

Eu sou uma grande apreciadora da praia. O barulho do mar, a brisa refrescante, as ondas quebrando, o céu azul. A sensação de que o tempo passa mais devagar. Parar e apreciar a paisagem é altamente terapêutico para mim.

Mas, um dos elementos que tornam a praia um lugar tão especial é, também, um de seus grandes inconvenientes: a areia.

A areia, que, por vezes, fica impregnada em nossas roupas e cabelos, que gruda no corpo, que o vento às vezes joga nos nossos olhos, que se instala em lugares dificílimos de retirar. Tão linda e tão trapaceira.

Mesmo assim, eu gosto da areia. Gosto de tirar os chinelos e caminhar descalça, sentindo a areia fofa sob os meus pés. Fico pensando no quanto essa areia já voou para lá e para cá, já tomou chuvas e tempestades, quantas pessoas passaram por ali – mas, no fim do dia, ela continua lá, adornando a orla de dourado.

Quando eu era criança, tínhamos o hábito de construir castelinhos de areia. Nada muito impressionante, é verdade. Mas, meu irmão e eu passávamos horas moldando as torres, decorando os detalhes com aquela mistura de areia e um pouco de água. O kit com baldinho e pazinhas fazia nossa alegria durante horas (para alegria e sossego, também, de nossos pais).

É claro que a concepção sempre era melhor que a execução, mas isso nunca nos impediu de construir nossos castelinhos. Mesmo sabendo que, logo, eles iriam desmoronar, e teríamos de começar tudo de novo no dia seguinte.

Mas, essas experiências me ensinaram que o importante não era a durabilidade do castelo, e sim o processo de construi-los. Fazia parte do ritual de estar na praia.

Hoje, adulta, eu não faço mais castelos de areia – ao menos, não no sentido literal. Mas, frequentemente, tenho a mesma sensação de estar constantemente tentando construir minha vida, edificar um castelo, trabalhar duro nos detalhes – e acabar vendo tudo desmoronar quase que instantaneamente.

É como se todas as certezas que eu busco estivessem – tal qual a areia – escorrendo pelos meus dedos, e fosse impossível segurá-las. E quanto mais eu me esforço para construir algo sólido, mais fortes parecem ser os ventos ou as ondas que irão derrubar tudo.

Mas, sigo levando comigo o aprendizado obtido durante minha infância: muitas vezes, você só tem que continuar fazendo – e pode ser que, neste castelo de areia chamado vida, realmente, o processo seja mais importante que o resultado.

Sobre o autor

Mayara Godoy

Palestrante de boteco. Internauta estressada. Blogueira frustrada. Sarcástica compulsiva. Corintiana (maloqueira) sofredora. Capricorniana com ascendente em Murphy. Síndrome de Professor Pasquale. Paciente como o Seo Saraiva. Estudiosa de cultura inútil. Internet junkie. Uma lady, só que não. Boca-suja incorrigível. Colunista de opiniões aleatórias. Especialista em nada com coisa nenhuma.

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