Quando Megan Rapinoe, na semana passada, cobrou de celebridades do futebol masculino – Lionel Messi, Cristiano Ronaldo, Zlatan Ibrahimovich – um ativismo a favor de causas como a luta contra o racismo e o sexismo no esporte, sua voz foi abafada. Seu pedido foi ironizado por homens que, tentando distorcer a intenção de Megan, destilaram seu veneno barato indicando que a jogadora não se importava com as outras causas já apoiadas por tais atletas, que fazem enormes doações para ONGs, hospitais e campanhas contra a fome, o câncer, a pobreza.
Pior que o desvio do significado das palavras de Rapinoe, foi ver novamente o quanto as pessoas andam espalhando seu ódio gratuito, usando de qualquer argumento que possa soar lacrador, mas que não passa de uma incoerência – já que o fato de os jogadores doarem dinheiro para causas sociais não implica em seu apoio aos que sofrem preconceito. E o quanto a voz dessa horda aumenta redes sociais afora, ao ponto de uma pessoa que eu considerava sensata e esclarecida compartilhar tamanha estapafúrdia.
Enquanto isso, Lukaku sofre racismo semanalmente na Itália, e acaba de ter sua foto estampada em um jornal como destaque com o jogador Smalling, junto do título “Black Friday”. Recentemente, o presidente do Brescia disse em uma entrevista que Balotelli “está trabalhando para se clarear”. Torcedores do Manchester City atiraram objetos contra o jogador Fred, do Manchester United, enquanto imitavam um macaco, no sábado passado. É 2019 e os atletas de diferentes etnias ainda são alvo de injúria racial nos estádios.
Confesso que tantos exemplos de ódio gratuito serviram pra me fazer também odiar. Depois de testemunhar tais absurdos nesses últimos dias, eu genuinamente desejei que houvesse uma aniquilação de todo e qualquer ser machista e racista nesse universo. Mas, depois de regurgitar minha bile e de me permitir muitos momentos de tristeza, o que sobrou foi a reflexão: por que somos odiados? O que nós, mulheres, fizemos para merecermos ser alvo de tanta maldade? O que os negros fizeram para serem atacados gratuitamente? Dentro e fora do esporte, por que fazem questão de diminuir a importância das nossas causas?
Eu não tenho a resposta, mas essas são perguntas que me fazem definhar. Somos todos seres humanos e deveríamos ser vistos e respeitados como iguais. Porém, cada vez que alguém diz que o racismo é normal, a gente morre. Cada vez que relativizam a violência, a gente morre. Cada vez que falam de feminicídio e estupro como se a vítima tivesse feito por merecer, a gente – literalmente – morre. Cada vez que o machismo e o preconceito ganham força, a nossa “humanidade” é um pouco mais enterrada.
Então, para você, caro conhecido, parente ou amigo que às vezes compartilha, talvez até inocentemente, declarações, pensamentos e piadinhas que estimulam esse ódio e que desvalorizam as nossas lutas, eu peço que aproveite o fim desse 2019, lembre-se de que este já é o século XXI, sinta um pouco de culpa e reflita. Porque esse é um ódio que realmente nos mata.
Vivemos em um mundo doente e se não tomarmos cuidado, adoecemos juntamente.
Já estamos doentes, Wilton. Isso é o mais triste, como sociedade, estamos doentes.
Resgatada a nossa capacidade de fazer perguntas como as crianças poderemos caminhar para respostas e proposições. Entender as razões de tanto ódio é o começo. Continuemos, Rose, a questionar.