Aos lugares que eu (ainda) não conheci

Neymar tem muitos defeitos, e em nada eu simpatizo com sua pessoa. Mas, se houve um momento em que esse sujeito fez com que eu me sentisse representada, foi ao popularizar  um sentimento intrínseco aos nostálgicos da pandemia: saudades do que a gente ainda não viveu. 

Agente de viagens nada resignada e wanderluster de coração, falo aqui das saudades dos lugares que ainda não conheci. Sinto falta da Barcelona que eu não visitei. Das sacadas da Casa Batló, enfeitadas com rosas para o dia de Sant Jordi. Falta de não conseguir colocar a Sagrada Família numa foto; de andar por Montjuic me imaginando Daniel Sempere em um livro do Carlos Ruiz Zafón. 

Os vinhos que eu não tomei comendo parrilla em Buenos Aires, os livros que eu não folheei no Ateneo, as medialunas que eu não provei – pra depois reclamar que só tinha isso todo dia no café da manhã do hotel que eu não fiquei. Os alfajores Havanna do duty free. O espanhol que eu não pratiquei flertando com um turista qualquer – que depois eu descobriria ser brasileiro – no Temple Bar. A esperança de esbarrar com Ariel Palácios em alguma esquina e tietá-lo. 

A Bogotá que eu não conheci, com o Museu do Botero que eu não visitei. Onde eu compraria um print da Monalisa. Os cafés Juan Valdez que não tomei, os quatro andares do céu ao inferno no Andrés Carne de Res. A esticada até a Cartagena, do “Gabo” e das sacadas floridas, que eu não fiz.

São tantos os lugares que eu talvez pudesse ter conhecido, mas que sempre ficaram pra depois… para quando tivesse uma promoção; para quando eu juntasse dinheiro; para quando a cozinha – que nem me pertence mais – fosse reformada; para quando eu tivesse companhia para ir. Ou quando a minha então companhia quisesse ir. Ficou tudo pra depois, e esse depois nunca veio. 

Hoje, acompanho as notícias de um mundo de lugares fechados. Ouço Piazzola e espero por uma Argentina que não reabre. O dia de São Jorge chegou e eu chorei com as rosas simbólicas de uma Catalunha triste. Busco Botero mundo afora, tudo no remoto, no virtual. Até desejo aquela água quente e aquele biscoito horroroso que nem é servido mais nos poucos voos que agora decolam pelo Brasil.

Eu, que vivia há mais de 10 anos de fazer os outros viajarem, de planejar sonhos, de resolver perrengues (chiques, já que viajar é um luxo a que a maioria dos brasileiros não se pode dar), deixei de viajar pra realizar os meus sonhos. E, muitas vezes, o fiz por motivos menores. Hoje, sou arrependimento e saudade.

Por mais que, graças à tecnologia, se possa conhecer outras cidades sem sair do lugar, nada é como a emoção de ver tudo ao vivo lá fora. Reproduzir receitas em casa não tem o mesmo sabor de prová-las em seu local de origem. Um sotaque diferente fica ainda mais belo quanto se ouve de pertinho. E não há aromatizador de ambientes que substitua o cheiro do quarto de hotel quando se abre a porta. 

Aos lugares que eu ainda não conheci, me esperem: eu ainda preciso ir.