Relatório de Evidências

Uma viagem em 3 atos

Escrito por Breno Amaro

Toda viagem tem três momentos: o antes, o durante e o depois. Cabe a nós saber saborear cada um deles.

Viajar é uma das melhores coisas do mundo e, talvez, uma das poucas unanimidades na história da humanidade.

E, se analisarmos bem, toda viagem pode ser dividida em três partes.

A preparação.

O antes da viagem. Aquele momento em que você precisa equilibrar sua vontade de conhecer lugares, pessoas, gastronomias e culturas novas, com o orçamento limitado que lhe permite reduzir drasticamente as opções de destinos e o tempo de duração.

Mas tudo bem. Ainda dá pra se divertir com o que você guardou e separou durante um ano inteiro pra isso.

Destino escolhido? Hora de decidir onde ficar. Hotel? Não tenho dinheiro. Albergue? Não tenho idade. Acampar? Não tenho coluna. AirBnb? Hum… Tá aí. Apartamentozinho honesto, boa localização, sem os luxos de um hotel, sem os perrengues de um albergue e sem as ameaças de morte de uma floresta.

Agora, os passeios. Museus, parques, praias, lojas, monumentos, aquele famoso restaurante tailandês, o que não falta é opção. Mas você só tem cinco dias. Moleza. Vai pra praia de manhã, a caminho do museu de tarde, que fica do lado do parque, onde ficam os monumentos mais legais, e passa nas lojas no caminho de volta pra casa, onde você vai pedir delivery do restaurante tailandês.

Infelizmente, tem uma parte burocrática. Visto, passaporte, vacinas etc. Mas isso só é chato. Não difícil.  

Mas compensa na hora de fazer a mala. (Sim, eu gosto de fazer malas pra viajar). O cálculo de quantos dias, de quantas roupas, da temperatura, do espaço máximo que você pode ocupar, pensando nas compras que vai fazer e nas tranqueiras que vai trazer, sem passar do limite de peso. Juntou com uns gadgets e uma malinha de mão com o básico, e pronto.

Agora é só esperar o dia da viagem. Aqui começa a ansiedade.

A viagem.

Nas véspera, é aquele nervosismo. Tem que acordar cedo, tem que pegar um táxi ou um Uber, tem que ter porta-malas grande, tem que chegar 2, 3 ou 4 horas antes do voo, tem que ter todos os documentos em mãos, tem que torcer pra balança caseira ter acertado o peso da mala, tem que rezar pra dar tudo certo.

E normalmente dá.  

Você acorda meia hora antes do despertador, o primeiro Uber que você pede é uma SUV, não tem engarrafamento a caminho do aeroporto, você lembrou de todos os documentos, até os que não precisava, sobraram quase 10 kg de capacidade da sua mala, você ainda ganha um upgrade pra classe econômica plus (o amendoim já vem sem casca) e não tem ninguém do seu lado.

Agora é só relaxar e aproveitar as horas de voo, até seu destino.

Porque chegando lá, tudo que você planejou pode mudar. O AirBnb não parece nada com o que você viu nas fotos. A localização está correta, mas agora tem um prédio sendo construído em frente. Os locais que você queria visitar estão fechados para reforma ou não combinam com o mau tempo.

Mas tudo bem, vai bater perna e descobrir que, às vezes, é necessário criar novos planos a cada segundo.

Você pode achar um teatro com uma peça que você queria ver. Um restaurante com desconto por ser baixa temporada. Uma turnê de um artista que você gostava quando era adolescente. Uma pessoa local que pode te dar dicas da cidade sem serem os pontos turísticos, caros e cheios de filas.

É manter a mente aberta a novas possibilidades. Vai que, numa dessas, você acaba escrevendo seu próprio guia informal de viagens para não-turistas. É isso que acontece, quando tudo pode acontecer.

Até no último dia. Dia de fechar a mala. Aquela mistura de felicidade por tudo que viveu, com uma leve melancolia de não pode viver ainda mais. Cada lembrancinha, cada souvenir, até o folheto de divulgação do restaurante tailandês que você nem vai ter como pedir, mas faz questão de levar de volta pra casa.

Mas, o mais importante é a sensação de que pode até não ter aproveitado tudo o que queria, mas que, com certeza, aproveitou tudo o que podia.

A volta.

Aqui, a magia já acabou. O portão de embarque do seu voo vai ser trocado umas 3 vezes, A fila pra embarcar vai misturar tudo: VIP, Business, Gold, Platinum e mortais. Não só vai ter alguém do seu lado, mas vai ser alguém que faça barulho, seja uma criança chorando ou um adulto roncando. O avião da volta vai ser menor que o da ida e suas pernas não vão caber no assento. E você vai ter muita sorte se não rolar uma daquelas turbulências que convertem qualquer ateu.

Finalmente, apesar dos pesares, o avião pousa, você consegue desembarcar vivo e agora só precisa pegar um táxi pra casa. Mas a fila de táxi está gigante, as pessoas estão cansadas, é uma segunda-feira de manhã, a cidade está um caos.

Depois de alguns perrengues, você consegue um táxi. O motorista é até simpático, pergunta de onde você está vindo, como foi sua viagem e se você está cansado. Papo de taxista. Pelo menos, isso foi tranquilo.

Até você chegar ao seu destino. Casa. A de verdade. A que tem tampa de privada com o formato das suas coxas.

Agora é só subir e se jogar na cama pra descansar dessa viagem. Só precisa dar uma conferidinha rápida se está tudo bem com as malas. Não está. Pois alguém nas alfândegas resolveu abrir sua mala para “averiguar uma possível ameaça”. Confiscaram uma lata de pílulas para ajudar a dormir e uma mauiagem que uma amiga tinha pedido para comprar.

Nessa hora, está liberado ficar revoltado. Ninguém te perguntou o que era, ninguém questionou se era para consumo próprio ou para presente, ninguém se importou.

Você começa a revirar a mala para ver se pegaram mais alguma coisa, algum presente mais caro, ou aparelho eletrônico, algum item valioso ou até um objeto pessoal.

Voa calça, camisa, meia suja, casaco pesado, nécessaire… Todo o conteúdo da mala decola com força de dentro da mala para o chão.

Até aparecer o folheto do restaurante tailandês, no fundo.

Sim, aquele papelzinho que vai fazer você esquecer que está estressado e lembrar sempre como aquela viagem valeu a pena.

Sobre o autor

Breno Amaro

Oi, eu sou o Breno. Carioca, redator, flamenguista, fã de surf, do Philadelphia Eagles e de Cavaleiros do Zodíaco. Faixa preta em Mortal Kombat e bi-campeão do World Series of Pavê 2015-16, comecei a escrever porque nunca aprendi a desenhar. Eu me fantasio de Ryu, de Ivan Drago e de Tigre no carnaval. Uma frase? “Trabalhe com o que ama e você nunca vai precisar trabalhar na vida, porque vai morrer de fome”. Escrevo sobre tudo o que passa na minha cabeça, sobre tudo que acontece na minha vida e, sobretudo, sobre nada. Meu cachorro se chama Bolinho.

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