Eu amo ouvir música. Escolho músicas para chorar. Pra lavar louça e cozinhar. Pra treinar. Pra fazer alongamento (e até pra definhar no burpee). Pra ir ao mercado comprar produtos de limpeza. Músicas pra tomar banho. Pra escrever. E pra fazer amor. Porque a música deixa tudo melhor.
Aplicando aqui a inveja gospel, cobiço o direito adquirido de meus amigos, que podem trabalhar ao som de uma trilha sonora. Às vezes, confesso, plugo meus fones no celular pra ouvir áudios no Whatsapp e aproveito para dar uma relaxada escutando qualquer coisa que me indiquem no Spotify. Se, pra muitos, o silêncio traz concentração e paz, pra minha mente, ele traz ansiedade. Então eu fico ali, com o fone em só um dos ouvidos (no lado que ainda funciona – do acessório, não do órgão), embalando o cotidiano como se fosse uma daquelas cenas de transição de alguma comédia romântica.
Em minha necessidade de materializar o impalpável, imagino a música como um botãozinho. Um clique que liga a vida dentro de mim. Aperto o play e sinto o som correndo dos ouvidos pro peito – deveria ser pro cérebro, mas me deem essa licença poética. Meu coração acelera. Mas minha respiração ansiosa se acalma. Traduzo a música como uma estática que eriça os pelos dos meus braços. E como uma mensagem que evoca aquelas emoções de encher os olhos de lágrimas.
Não sei dos relatos – também não tive força de vontade o suficiente para pesquisar – de quem inventou a primeira música, se surgiu de uma batucada do homem primitivo tentando fazer fogo com duas pedrinhas, se os primeiros humanos queriam reproduzir os sons da natureza. E talvez os músicos que compõem o corpo de escritores deste site possam elucidar essa questão eventualmente. De qualquer forma, o meu “bem aventurado seja” vai para quem criou a música – e pra quem deu vida ao David Gilmour.
Ligando o modo saudosista, me apraz relembrar minha infância (um pouco depois da vitrola), quando a música vinha envolta em papel celofane e num ritual que consistia em abrir a tampa do 3 em 1, retirar o vinil da capa com a ponta dos dedos e colocar a agulha com todo o cuidado sobre o disco. E os que não podiam financiar sua discoteca pessoal seguiam outra prática: a de ligar para a rádio e pedir sua música, preparar a fita K7 e aguardar a tão esperada canção tocar para ser gravada (com todo aquele amadorismo que perde um pedaço do começo, ou com a intervenção do narrador informando a hora local).
Hoje, a música vem como os millenials gostam: instantânea, imediata. Mas, descobrir uma música com o Shazam e preparar uma playlist no serviço de streaming configura novos rituais de prazer. E – pode procurar – todo mundo tem playlist para TUDO nessa vida. Se não tem, é porque não houve o tempo ou a organização necessários para selecionar a trilha. Mas ela já está formada em nossas cabeças, tocando em silêncio enquanto nos faz companhia. E nos relaxa, nos excita, nos anima, ou traz à tona a melancolia.
Tamanho é nosso envolvimento com a música, que muitos períodos e pessoas importantes das nossas vidas são marcados por trilhas sonoras. A música tem esse poder mágico de reativar memórias esquecidas, de nos encher de tudo que podemos relacionar a sentimentos, de nos transportar pra outros momentos e lugares. Gosto de pensar que a música é assim, tão necessária, porque consegue pôr os filmes da nossa vida em cartaz de novo. Por isso, apesar de a escrita e a literatura serem minhas maiores paixões, garanto com o coração nos ouvidos que a música é arte mais poderosa e impactante que temos o privilégio de poder apreciar.
Trilha sonora: On An Island
[…] onde estávamos, com quem, em que ocasião, e até com que roupa, quando ouvimos uma determinada música pela primeira vez, por exemplo. Quem nunca pegou absoluto trauma de uma determinada canção por […]
[…] me conhece sabe: a música é algo muito forte e presente em minha vida. E, quem gosta, costuma ter canção pra tudo. Para […]
Um ode à musicalidade. Genial.
Só um reparo: amo Gilmour, mas ainda sou do Waters Team!
Arrasou no texto!!
Obrigada, Gabi! Minha leitora mais fiel da agência hahahahah