Amor é prosa

Rasguei os contos de fadas

Escrito por Patrícia Librenz

As mulheres ainda estão muito acostumadas com a ideia de serem pedidas em casamento. Mas, por que uma mulher tem que esperar o homem tomar uma iniciativa por ela, se ela já tem certeza do que quer?

Hoje se fala muito de empoderamento feminino, mas as mulheres ainda estão muito acostumadas com a ideia de serem pedidas em casamento. Eu, por exemplo, mesmo tendo a convicção de que meu namorado queria o mesmo tipo de relacionamento que eu (afinal, nossa casa estava quase pronta), refleti e percebi que estava condicionada a “esperar pelo pedido oficial”. Então, quando comecei a cogitar fugir desse comportamento padrão, bateu a insegurança: “será que eu devo mesmo fazer isso?”. Afinal, o que é incomum incomoda e eu não sabia se quando falamos em casamento ele imaginara uma certidão.

Embora meu esposo seja extremamente carinhoso, está a anos luz de ser um homem romântico. Além de ser muito discreto, não faz estardalhaço para nada e é avesso a surpresas. Logo, se eu quisesse um pedido de casamento, um momento especial para recordar, eu mesma teria que providenciá-lo. Me peguei fazendo pesquisas na internet sobre como pedir alguém em casamento – e só achava ideias para os homens pedirem suas namoradas. Até que me deparei com um blog de uma mulher que decidiu falar sobre o assunto, mas o objetivo dela era o desencorajamento, com frases de efeito, tipo:”pense bem, pois uma rejeição pode abalar seu relacionamento”e “se ele quer se casar, o que o impede de fazer o pedido?”. Mas uma frase, em especial, mexeu com a feminista que brota em mim: “por que você quer tomar essa iniciativa ao invés de esperar que ele faça isso?”. E aí eu respondo com outra pergunta: por que uma mulher tem que esperar o homem tomar uma iniciativa por ela, se ela já tem certeza do que quer? Já trabalhamos e pagamos nossas contas, até quando estaremos fadadas a esperar que alguém tome as rédeas de nossas vidas?

Essa condição passiva, “de princesa”, é a minha crítica aos contos de fadas tradicionais. Essas histórias vêm sendo repetidas há séculos, reforçando a condição submissa da mulher, pois à protagonista dos contos de fada, só restava esperar… E nada aconteceria em sua vida se ela não fosse salva por um príncipe encantado, pois essa princesa só era protagonista do ponto de vista da teoria literária; todavia, do ponto de vista filosófico, essas mulheres eram meras espectadoras das próprias vidas. Tanto que não havia mais nada para ser contado após o beijo do príncipe, a não ser o “viveram felizes para sempre”.

Eu sou o tipo de pessoa que, quando quer, faz acontecer! Então, preparei uma surpresinha para o Mozão na Noite de Natal (um foto-livro bem piegas, com nossa história sendo contada através de fotos e frases curtas). Uma das últimas fotos era a da nossa casa, ainda em construção. Na página seguinte, havia um envelope colado na folha, dentro dele, estava escrito: “Luiz, você quer ser meu marido?”. Na “caixinha do sim” havia duas alianças. Na “caixinha do não”, só uma correntinha preta de aço. Sim, ele teria presente para qualquer uma das respostas!

Caso ele se decidisse pelo não, morreria sem saber o que havia na outra caixinha (eu devolveria as alianças, compradas pela internet, e teria o dinheiro de volta), e ele só ganharia uma correntinha de presente de Natal… o curioso é que, apesar do casamento já ser algo praticamente líquido e certo, eu ainda me apegava àquele 1% de dúvida. Morar na mesma casa estava garantido, mas eu não sabia se ele estava disposto a assinar um contrato e mudar o estado civil. Mesmo assim, eu já havia comprado o vestido que usei no “dia do sim oficial” – se eu não ganhasse o noivo, pelo menos a roupa branca para o Réveillon estaria garantida!

Sobre o autor

Patrícia Librenz

Mãe de dois gatos, um autista e outro que pensa que é cachorro. Casou com um veterinário, na esperança de um dia terem uns 837 animais. Gaúcha no sotaque, pero no mucho nos costumes. Radicada em Foz do Iguaçu desde 2008, já fez mais de 30 mudanças na vida. Revisora de textos compulsiva, apaixonada por dicionários. A louca do vermelho. A chata que não gosta de cerveja. A esquisita que não assiste a séries. Dona da gargalhada mais escandalosa do Sul do Mundo. Mestra em Literatura Comparada, é fã de Machado e Borges, mas ignorante de Clarice Lispector e intolerante a Paulo Coelho. Não necessariamente nessa ordem.