Já no leito de morte, Dona Leocádia resolveu abrir o coração. Não levaria para a vida eterna os erros e arrependimentos desta terrena. Chamou o marido, Seu Agenor, e começou a falar.
“Nunca fui santa”, confessou diante do olhar atônito do companheiro dos últimos 45 anos, mesmo tempo em que se dedicara à igreja do bairro, como ministra e catequista. Tudo o que Léo era é santa. Ao menos até aquele dia.
“Não quero que você tenha uma visão idealizada de mim…”, continuou com certa dificuldade, “eu te traí… cof-cof!”, respirou, já no estertor da morte. “…várias vezes…”
A máquina soou um silvo contínuo. Uma linha reta riscou o monitor. Enfermeiras entraram na sala e tiraram Agenor, aos prantos, do quarto.
A senhora foi levada à UTI e, talvez os anos de ministério expliquem, conseguiu ser reanimada milagrosamente. Os médicos não conseguiram explicar a rápida melhora e a resposta imediata à terapia, aos remédios e tudo mais. Quinze dias depois de quase ir desta, Dona Leocádia estava novamente em casa.
Seu Agenor a esperava com um vaso de begônias amarelas nas mãos. E um punhado de perguntas na cabeça.