Em poucos dias, ouvi de três pessoas diferentes a seguinte observação: “Para Fulana não está sendo tão difícil ficar em casa, pois já não saía muito”. Esse “diagnóstico” foi dirigido a uma pessoa que tem depressão. Os interlocutores, conscientes de suas próprias dificuldades de se manterem em confinamento em tempos de pandemia, não foram capazes de entender que pessoas que habitualmente se negam ou evitam a todo custo o contato social sofrem diante de tal condição.
A tendência ao isolamento ou autorreclusão, característica de alguns transtornos mentais, é sintoma dramático de milhares de pessoas ao redor do mundo, agravado ainda mais pela solidão e incompreensão a que estes são relegados cotidianamente. Fatos que deixam essas pessoas ainda mais vulneráveis. Pena que empatia é item em falta na humanidade.
Há uma lista imensa de doenças psíquicas, no entanto, como essas enfermidades ‒ que muitas vezes levam à morte ‒ não apresentam feridas físicas perceptíveis à visão, ao tato e ao olfato, são subestimadas, ignoradas, ou até negadas. Não apenas pelos leigos, como também pelas políticas públicas.
Quem se perguntou como estarão nesse momento os esquizofrênicos, os dependentes químicos, os bipolares, os obsessivos compulsivos, os ansiosos, os deprimidos, e outros tantos indesejáveis?
Talvez venha daí a dificuldade de manter os idosos em casa, pois eles já eram solitários e esquecidos antes de tudo isso começar. Viviam em mundos próprios. Ainda que sustentassem o lar ou ajudassem a cuidar dos netos, em muitos casos eram apenas o suprimento e não pessoas reais com quem se passa tempo conversando ou fazendo companhia. Eles não querem ficar presos a uma familiaridade rarefeita ou inexistente. Há certa sabedoria nisso.
Em um mundo que nega a ligação corpo/mente/natureza, e que atribui sofrimento mental a questões morais ou religiosas, é demais exigir que essas pessoas fossem acolhidas, exatamente num momento em que todos nós estamos doentes por não suportarmos a nós mesmos e os desafios para a sobrevivência individual e coletiva.
Que bom que há um grupo de pessoas que de tanto sofrer já estejam acostumados e preparados para o sofrimento! Uma coisa a menos para termos que lidar nesse momento em que solidariedade e compaixão são exigidos de todos nós. Infelizmente não há doses suficientes.
Estamos numa época em q estamos com medo da doença “física” mas esquecemos q o enfraquecimento da mente é mais rápido e silencioso. Este texto nos chama atenção que uma frase q parace “banal” prejudica e machuca mais q uma agressão física. 😘
Lendo seu texto lembrei de um trecho de um poema (Metade) de Oswaldo Montenegro que diz: “Que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável, porque metade de mim é a lembrança do que eu fui, mas a outra metade eu não sei…”