A forma como você arruma a sua casa quando não está esperando visita. Só porque quer curtir o seu cantinho ajeitado à sua maneira.
As roupas que você usa quando não vai precisar sair nem até o portão. Seus trajes que te fazem se sentir confortável em si mesmo.
O jeito como prende o seu cabelo quando está longe das lentes das webcams e das câmeras dos celulares.
A forma como você arruma a mesa para tomar o seu café da manhã, quando ele será apreciado única e exclusivamente por você, e não foi um cenário milimetricamente montado para compor uma bela fotografia para o Instagram.
Os diálogos que você simula em frente ao espelho: a entonação de voz, as expressões faciais. O que você diz para si mesmo – e o que você gostaria de ter coragem de dizer a outros.
As preces que você faz antes de dormir, mesmo que não seja uma pessoa religiosa, com seus agradecimentos e súplicas. As lágrimas que você deixa rolar em silêncio, quando o peso em seus ombros e o aperto em seu peito já se tornam insuportáveis.
As noites que você passa em claro. Os tragos que você toma sozinho no sofá, olhando para a televisão desligada. Os cigarros que você fuma na sacada, observando o vasto mundo lá fora (e nem fumante de verdade você é).
A comida que você cozinha do seu jeito, com o seu tempero, no seu tempo, picando os ingredientes ao seu modo. E saboreia harmonizando com a bebida que chef nenhum recomendaria. Mas você gosta.
Os filmes repetidos a que você assiste quando está sozinho. Os álbuns da sua banda favorita que já caiu de moda. Os livros dos quais você não consegue se desfazer porque ainda guardam uma dedicatória. E aqueles que você nunca leu mas gosta de ostentá-los na estante.
As horas que você passa contemplando o silêncio, ouvindo apenas os seus próprios pensamentos e confrontando suas verdades – e principalmente suas mentiras.
Tudo isso, que se passa longe dos olhares e julgamentos alheios, que ocorre no mundo offline, que não é postado e transmitido aos seus seguidores, que não é fotografado e enviado nos seus grupos de WhatsApp, que não é encenado para agradar quem quer que seja.
Tudo isso, e apenas isso, é quem é você de verdade. O resto, como diria minha grande amiga Nathália Karl, é perfumaria.
Sublime e sereno.