Eu tinha oito anos quando comecei a ouvi-lo. Havíamos acabado de nos mudar para uma casa nova, e, já na primeira noite, ele estava lá: na parede detrás da cabeceira da minha cama, um ruído, como se alguém, emparedado vivo, tentasse encontrar a liberdade usando as unhas. Só havia um problema: a parede detrás da cabeceira da minha cama dava para a rua.
Toda noite, bastava as luzes se apagarem, o ruído começava. Procurei em todo o quarto, cheguei a ir até a rua escondido, não descobria do que se tratava. Se acendesse a luz ou me levantasse da cama, ele cessava. Meus pais, evidentemente, não acreditavam em mim. Achavam que era algum barulho da rua, alguma árvore, algum equipamento elétrico. Mas era muita coincidência: apenas quando eu estava pronto para dormir, deitado e com as luzes apagadas, o ruído começava.
No primeiro ano, achei que fosse enlouquecer. Depois, como com tudo na vida, acostumei. Morei dez anos naquela casa, dez anos com um ruído sinistro me ninando à noite. Me mudei para fazer faculdade em outra cidade, conheci minha esposa por lá e por lá fiquei. Visitava meus pais ocasionalmente, mas jamais quis ficar em meu antigo quarto, que meu pai transformou em um escritório. Sempre dormia em um hotel, alegando mais privacidade para mim, minha esposa e nossos filhos. Meu pai sempre dizia jamais ter ouvido o ruído, mesmo quando ficava trabalhando no escritório até tarde da noite.
Passados cinquenta anos, tenho a oportunidade de, talvez, solucionar o mistério de uma vez por todas. Meus pais faleceram, não tenho interesse em manter a casa. Decidi vendê-la para que construíssem um prédio no lugar. Fiz apenas uma exigência: estar presente durante a demolição.
Desejo agora, entretanto, que não o tivesse feito. Pois, demolida a casa, foi encontrado, sob seus alicerces, um cemitério clandestino. Uma família, talvez, já que eram poucas ossadas. Uma delas me chamou a atenção.
Uma criança. Deitada de barriga para cima. No local onde ficava meu quarto.
Falanges tocando a base da parede detrás da cabeceira da minha cama.
Guilherme, fiquei em suspense com seu conto. Achei que fosse real, mas me deparei com a idade e o falecimento dos seus pais….e como sou amiga da sua mãe, vi que era apenas ficção. Mas parecia bem real…ainda bem que li agora pela manhã, quando sua mãe me enviou o link, caso contrário não teria dormido. Meus avós tinham umas histórias sinistras assim, mas diziam que era real rsrsrs. Mas vamos ao que importa, parabéns pelo seu talento, vou com certeza ler outros textos e já indiquei para um montão de gente. Adorei.
Olá Luciana. É um conto em primeira pessoa, desculpe se isso não ficou muito claro no início. Que bom que vc gostou! Abs
Muito bom, o Guilherme escreve muito bem e com temas interessantes. Parabéns.
Obrigado, Paulo! Abs