Divã-neando Pensamentos crônicos

Silêncios

Foto de Possessed Photography na Unsplash
Escrito por Rose Carreiro

Não sou amiga do silêncio. O que para uns é paz, para mim, é alerta. Uma perturbação se instala dentro de mim, como a dos silêncios que precedem as músicas de perigo nos filmes de terror, na cena onde algo vai dar muito errado para um personagem. 

Ansiedade, aflição, enxaqueca, desassossego: é assim que funciona o silêncio na minha cabeça. Eu estou sempre pensando, sempre ouvindo uma voz, sempre falando comigo, com as gatas, com quem estiver por perto. E, se eu mergulho no silêncio, ele não me dá paz – ao contrário, me desperta, me deixa atenta. 

Custo a me silenciar. Por mais que eu estrague tudo, sou verborrágica, preciso externar. E precisa ser na minha hora, do meu jeito, com o meu tom. O preço que eu pago por isso? Alto. Caro. Doloroso. Extenso. Talvez irreversível. Mas, se eu não falo, se não escrevo, engasgo. Uma Clarice Lispector sufocada com as palavras que não falava ou escrevia. 

O silêncio significa muitas coisas. E o silêncio muitas vezes é uma resposta. Silêncio é ouro – o calado sempre vence, diria uma frase popular. Eu vivo sempre na arritmia, com o coração acelerado se decidindo entre guardar o silêncio ou deixar que tudo saia pela minha boca ou pelos meus dedos. 

Mafalda tem uma tirinha em que questiona: Para onde vão nossos silêncios quando deixamos de dizer o que sentimos? Os meus pesam aqui, no peito, quicam dentro de mim, me puxam pelos cabelos, latejam nos calcanhares como um calçado apertado, ardem na boca do estômago.

Eu aceito os silêncios alheios. Só não consigo cultivar os meus. Tudo o que está aqui dentro precisa sair, ou me consome. E, de tanto ser consumida por silêncios de ansiedade, de estresse, de insegurança, o meu corpo também é consumido, uma dieta que eu não pedi para fazer. Os silêncios me derrubam as energias, levam de mim o sono, apagam o viço dos meus olhos, me tiram o apetite. 

Talvez eu goste tanto de escrever porque sou um ser comunicante. E como eu me sinto leve depois que eu me expresso. E valorizo quem queira se comunicar de forma honesta.

Comunicar é dividir, e acho que estamos aqui pra isso: dividir a vida, os momentos bons e ruins, o conhecimento, o amor. Já vivi relações sem comunicação aberta, não só amorosas, mas também familiares, e já desisti de amizades pelo mesmo motivo. Porque os silêncios do outro lado, assim como os silêncios que tenho que me infringir, me machucam. 

Não sei o que o silêncio faz com você. E respeito quem o prefira. Mas eu preciso do som, da informação, da letra, da imagem. Da comunicação. Eu preciso dizer – e digo. Pode ser que um dia eu não diga mais, e nesse dia eu terei morrido – de fato, ou apenas pra você, pra alguém, pra algum sentimento, pra algum lugar.
De alguma forma. 

Sobre o autor

Rose Carreiro

Nascida num 20 de Outubro dos anos 80. Naturalmente petropolitana, com passaporte carioca. Flamenguista pé frio e expert em não se aprofundar em regras esportivas. Fã de Verissimo – o Luis Fernando – e Nelson, o Rodrigues (apesar de tudo). Poser. Pole dancer com as melhores técnicas para ganhar hematomas. Amadora no ofício de cozinhar e fazer encenações cômicas baratas. Profissional na arte de cair nos bueiros da Lei de Murphy.

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