Pensamentos crônicos

E se eu tiver que dar um reset na vida?

Escrito por Convidado (a)

O que é dar o reset? É se reerguer depois de um divórcio? É superar o luto pela perda de alguém muito amado?É se mudar de cidade, de país?

Texto: Fernanda Lizardo

Se você acompanhou os tempos áureos dos blogs, nem precisa de muita introdução. Fernanda Lizardo, tradutora, jornalista, administradora de condomínio, modelo de cabelos coloridos – e mais um milhão de coisas – é também a autora do blog que virou o livro Sexto Sexo, em que narrava as aventuras sexuais da personagem Cooper.

Outro dia, passou pela minha timeline no Twitter uma frase mais ou menos assim: “Não aguento mais ter que ficar dando reset na vida. Estou ficando velho pra continuar recomeçando…”

Aí eu fiquei pensando nesse “reset”. O que é dar o reset? É se reerguer depois de um divórcio? É superar o luto pela perda de alguém muito amado? É conseguir um novo emprego depois de um tempão fora do mercado? É se mudar de cidade, de país?

Aí resolvi listar alguns dos resets que já dei na vida. 
Eu já larguei faculdade no meio.
Já fui demitida. Duas vezes.
Já me mudei de cidade pelo menos umas oito vezes. Já me mudei de casa mais vezes do que consigo me lembrar.
Já terminei e comecei relacionamentos.
Já troquei de carreira. 
Já servi mesa de bar e já embarquei em plataforma de petróleo.
Enfim, foram muitos resets; se eu fosse tentar enumerar todos, provavelmente mataria você, caro leitor, de tédio.

É claro que eu sei que mudanças são difíceis. “Puxa, eu gostava tanto daquele emprego e de repente fui mandado embora!? O que vou fazer da vida? De onde vou tirar dinheiro?” A situação por si só já é uma merda. E tudo fica ainda mais pesado porque somos programados para desenvolver o apego.

Segundo Jude Cassidy, professora de Psicologia na Universidade de Maryland, “o apego pode ser definido como um comportamento biologicamente programado cujo papel na vida dos seres humanos envolve o conhecimento de que um outro está disponível, proporcionando um sentimento de segurança que fortalece a relação”. A médica Maria Regina Galante-Nassif, que já desenvolveu estudos sobre o luto, diz que “os comportamentos de apego [desenvolvidos na primeira infância] podem ser reativados na vida adulta em três tipos de circunstâncias, a saber: situações que provocam medo, situações de mudança e interações conflituosas“.

E por isso é tão complicado dar o reset. Não fomos feitos para perder o que nos traz conforto. Dói desatar laços, desfazer certezas, perder aquele mínimo de previsibilidade que tanto dá segurança… É óbvio que nos inflige medo, que tira o sono. Mas tem um detalhe: quando você dá o reset, assim como acontece no computador, você não deleta tudo o que veio antes. Você volta a determinado ponto. Ao terminar seu casamento, você não volta a ser o solteiro da adolescência. Ao ser demitido, você não perde toda a experiência adquirida ou seu diploma. Ao perder sua mãe, ela desaparece de seu convívio, mas toda a herança emocional construída ao longo de anos permanece. 

O reset não é recomeçar do zero. O reset é recomeçar de determinado ponto. Sendo assim, a mudança brusca na vida não representa a perda de tudo, mas uma circunstância que às vezes necessita de mais tempo para ser restabelecida. E trago notícias: viver é isso mesmo — um turbilhão de coisas acontecendo, se modificando; às vezes boas, às vezes ruins. Por isso, é essencial fazer brotar forças não-sei-de-onde para recomeçar (inclusive com ajuda médica, se necessário). Até porque, se você não prossegue, se continua a se agarrar loucamente àquilo que ficou para trás, provavelmente vai ser engolido pelas mágoas, pela estagnação, pela sensação de frustração, de fracasso, de desestrutura.

O medo que a gente sente diante do reset é normal, mas você não pode permitir que ele seja incapacitante. Se existe sentimento mais contundente do que a tristeza, é a desesperança, a sensação de ausência de perspectiva.

Por isso, eu só quero dizer o seguinte: se você estiver dando um reset na sua vida neste momento, encare-o tal como ele é: um reinício de um ponto no qual o jogo desandou e foi preciso refazer alguns passos. Eu creio piamente que você vai passar de fase. 

Sobre o autor

Convidado (a)

2 comentários

Comente! É grátis!