Sem meias palavras

Como não reclamar?

Escrito por Thigu Soares

Em tempos de redes sociais, onde quase todo mundo é feliz, fica difícil e fora de moda ser insatisfeito. É impressionante notar como o direito sagrado à Santa Rabugice se perdeu.

Poucas coisas na vida podem ser mal vistas e tão gostosas quanto reclamar. Gostaria de afirmar isso com tranquilidade, como diria Julinho da Van. Na verdade, só não o faço com a tranquilidade do piloto em questão, pois a reclamação não advém da tranquilidade, mas da inquietação.

Em tempos de redes sociais, onde quase todo mundo é feliz, fica difícil e fora de moda ser insatisfeito. É impressionante notar como o direito sagrado à Santa Rabugice se perdeu. Ainda que o Twitter, no cenário cibernético, concentre os últimos mal humorados da grande rede, tudo é o paraíso para os demais.

Outro dia mesmo acabei tropeçando em uma tarde “postativa” de uma colega e me surpreendi com tamanha alegria, com uma percepção tão deliciosa e falsa da vida. Chequei perfil, histórico, tudo. Mesmo para uma pessoa com tranquilidade para não pensar em boletos, ela tava demais.

Naturalmente, ela foi apenas um exemplo em meio a um amplo espaço amostral de gente que parece viver em algum lugar maravilhoso, com uma vida em que todos os dias são bons e tudo funciona. São pessoas que parecem viver numa modulação urbana do Canal OFF!

Jamais será inveja, jamais! Tenho apreço pelo meu direito de chiar, pelo alívio que isso me provoca. Me pergunto apenas se essa gente não perde tempo em fila de elevador, não se irrita com restaurante que atende mal, não leva fechada no trânsito, não fica sem sinal de internet ou não precisa arrumar a casa.

Sinto que um Globo Repórter não seria tempo suficiente pra explicar a psiqué dessa espécie.

Até que descubram, me atenho ao prazer da rabugice e ao direito de reclamar do que não me agrada. Afinal, é isso que costuma libertar e nos forçar a seguir caminhos diferentes.

Sobre o autor

Thigu Soares

Um ex-jovem sempre velho que sonhou ser escritor. Blogueiro bissexto, cronista por vocação, "publicizeiro" totalmente por acaso. Intenso, exagerado, mal humorado, ácido e corrosivo. Leal, amigo e um pouco mentiroso. Flamenguista, carioca e pai de dois Pugs lindos. Luto contra a balança e brigo com a tarja preta. Já quis salvar ou o mundo, mas dá muito trabalho, mas dá preguiça… Mesmo sem fazer isso direito, tento seguir rabiscando como dá. É bom pra combater ou manter a loucura.