Desacato

Eu poderia falar de tanta coisa.

Escrito por Leandro Duarte

Eu poderia falar de amor e de flores, mas tem sempre um filho da puta roubando a minha brisa.

Eu poderia falar de tanta coisa.

Eu poderia falar de como as tardes estão bonitas por esses dias, do pôr-do-sol que tinge de amarelo a janela da minha sala, onde passo a maior parte dos meus dias em tempo de quarentena. Mas chegamos à marca de 7 mil mortes por Covid-19 só no Brasil, de que vale esse pôr-do-sol?

Eu poderia falar sobre o quão divertido é meu cachorro, Uísque. Sobre como ele ronca a tarde inteira enquanto trabalho de casa, sobre como ele parece resmungar e por vezes brigar ferozmente em seus sonhos de cachorro. Mas o merda do Moro passa quase um ano e meio dentro desse governo fascista e agora sai triunfal como paladino da moralidade e defensor da honestidade e dos bons costumes políticos, “fazendo o certo do jeito certo”. O sacana esperou a maior crise sanitária da nossa época para deflagrar uma baita crise política que paralisa ainda mais o poder público.

Eu poderia falar da minha coroa, do quanto ela é linda, carinhosa e carente ao telefone, reclamando que pela primeira vez em anos passará o dia das mães sem um bando de filhos à sua volta e falando que me ama. Mas tem toda essa massa de militantes imbecis seguindo o presidente, minimizando o problema pelo qual estamos passando, fazendo manifestação na porta de juiz do Supremo, insultando e agredindo profissionais da saúde que pedem melhores condições e equipamentos para combater este inimigo que é de todos, lutando pelo direito de proteger nosso povo com o mínimo de condição, lutando pelo direito de trabalhar em segurança.

Poderia falar do primeiro título do Senna que a TV reprisou no domingo. Poderia, após a reprise da final da Copa das Confederações, passar parágrafos xingando o David Luiz que queria dar alegria a seu povo, e que escolhi como meu vilão particular para o 7×1. Mas a cretina da Carla Zambelli, a ultrabolsonarista, está espalhando aos quatro ventos o absurdo de que caixões estão sendo enterrados vazios no norte e nordeste do país, causando pânico, fazendo com que famílias desesperadas com a perda de seus entes queridos se exponham à contaminação abrindo caixões lacrados antes dos dolorosos enterros em massa a que estamos assistindo diariamente.

Poderia falar da minha garota, do quanto a amo e do quanto a sua presença é essencial para que eu mantenha a saúde mental nesse tempo maluco que vivemos. Mas o filho da puta do presidente tá desfilando por aí, comendo pastel, falando um absurdo atrás do outro, afirmando que nossa única arma, o isolamento social, não serve de nada. Culpando os governadores que demonstram o mínimo de humanidade ao impor medidas de combate ao Covid-19, de todo o ônus econômico inevitável que teremos de enfrentar. Em momento nenhum esse imbecil demonstra empatia com as famílias acometidas por esse mal, tampouco dá sinais de que se importa com a vida do povo que o elegeu. Esse bosta segue sendo exatamente tudo aquilo que ele demonstrou que seria durante as eleições, e os que ainda o defendem têm sim o sangue desses 7 mil brasileiros nas mãos, bando de cuzão do caralho.

Eu podia falar de tanta coisa, mas sinto a necessidade de falar mais do mesmo, semana após semana. Não por prazer, mas por responsabilidade com o que acredito. Seguiremos gritando.

Sobre o autor

Leandro Duarte

Leandro, 33 anos, ganha a vida em projetos e TI, talvez por isso sem a menor paciência para toda essa bobagem nerd e cultura pop. Em resumo, inadequado. Grande demais para a poltrona do ônibus de todos os dias.
Pequeno demais para sorrir de tudo. Velho demais para um banho de chuva; muito novo para temer o resfriado. Direto demais para a palavra escrita, e de menos para se fazer compreender. Humano demais para viver de tecnologia. Humano de menos para largar tudo. Comunista demais para os dias de hoje. Comunista de menos para o que é preciso ser feito.
Mesmo inadequado, segue peleando. Como era de se esperar, falhando miseravelmente.

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