Murphy Days

Murphy na quarentena

Escrito por Mayara Godoy

Volta e meia ele dá as caras por aqui: Murphy, aquele que não é Rexona, mas também nunca te abandona.

Já faz quase um mês que eu – assim como muita gente – estou em isolamento em casa, por causa da pandemia da covid-19. Mas, ao contrário do que muita gente pensa, eu não estou sozinha. Estou na companhia dele, o inexorável, o infalível, o inefável, o inevitável: Murphy.

Velho conhecido de quem me lê (e lê a Rose), Murphy tem um jeitinho todo especial de se fazer presente na minha vida. E é claro que ele não iria me abandonar logo na quarentena, né?

Pois bem. Ficar em casa 24 horas por dia. Trabalhar em home office. Sair só para comprar itens de primeira necessidade (supermercado e farmácia, basicamente), o que poderia dar errado?

Em se tratando da minha vida, muita coisa.

Tudo começou há um tempo atrás na ilha do sol quando eu resolvi comprar uma cadeira de escritório, pois minha coluna – que, se este fosse o critério, certamente me poria no grupo de risco – simplesmente não aguenta as oito ou nove horas por dia que eu passo sentada nesta cadeirinha de jantar.

Tentei alongar, fazer os exercícios do pilates em casa mesmo, colocar almofadinha, e tudo o que vocês podem imaginar, mas, ao final do dia, minha lombar estava gritando de dor. Sem muitas alternativas, considerando que o isolamento ainda é por tempo indeterminado, comprei uma cadeira de escritório pela internet.

E eu não gosto de gastar dinheiro, mas sou da seguinte opinião: quando vou comprar algo, eu compro algo bom, para durar. Invisto um dinheiro pensando a longo prazo. Comprei uma cadeira hiper confortável, que tem até um sistema de fazer massagem. “Nunca mais terei dor nas costas”, pensei eu, inocentemente. (Sabe de nada, diria o cumpádi Washington)

Depois de alguns dias, recebi o produto em casa (Deus abençoe o e-commerce). Ela vem desmontada e eu tive que montar. Até aí, tudo relativamente tranquilo, já que eu acho bem divertido montar móveis, embora algumas partes sejam desafiadoras para alguém montar sozinho, mas não tá morto quem peleia. Montei.

Linda, maravilhosa, confortável, o sonho de uma vida. Eu poderia ser CEO de uma grande empresa sentada numa cadeira destas. A alegria durou até a hora que eu tentei regular a altura.

Como muitos de vocês sabem, eu tenho 1,70m de altura, e a maior parte disso é perna. Logo, a cadeira para mim tem de ser alta. Mas a alavanca de regulagem da altura veio com defeito e a cadeira não para ajustada. Ouço reverberar lá no fundo a risada maligna de Murphy, enquanto me sinto o Tyrion sentada em frente ao notebook.

Abro chamado para a loja, que prontamente se dispõe a recolher o produto para fazer a troca. Mas, como vocês sabem, o processo [coleta o produto; leva de volta pra loja; manda outra pra mim] demora, e não sei quanto tempo mais vai levar até eu receber uma cadeira nova. Coluna, seja forte.

Problemas acontecem, eu sei. E quase todos eles comigo.

Ah, vocês pensaram que tinha acabado? Quem foi inocente agora?

Continua a saga de nossa anti-heroína na quarentena: limpando a casa enlouquecidamente de medo do coronavírus, lavando todas as roupas muito mais que o normal, cozinhando em casa para evitar delivery, tentando ser uma cidadã exemplar e realmente não sair da porta a menos que seja imprescindível.

Quem resolve dar defeito agora? A minha máquina de lavar roupas. Na verdade, ela já havia dado defeito antes. Eu chamei o técnico, que veio aqui, olhou, apertou a rebimboca da parafuseta e me convenceu de que a máquina não tinha nada. Ao que ele foi embora, no dia seguinte ela apresentou o mesmo defeito (em resumo, está vazando água sabe Murphy de onde, e eu não posso usar o ciclo no nível alto de água). Liguei para ele de novo, que me disse que voltaria e me deixou no vácuo. Acionei outro técnico, que também me deixou no vácuo, e aí veio a quarentena.

Eu prossegui usando a máquina, óbvio, porque não tenho outra escolha. Mas só posso usar no nível médio, e ela também só bate para um lado, logo, as roupas não ficam assim nenhuma Brastemp (embora a máquina seja Brastemp, vejam a ironia). Mas está dando pra usar. “Vou usar assim mesmo meio capenga até acabar a quarentena e eu poder chamar outro técnico”, foi o que pensei.

Até que um dia percebi que ela não conseguia centrifugar. O tambor ficava batendo de um lado para o outro e não conseguia girar. Percebi que a borracha que segura o tambor nas bordas da máquina (para que ele tenha margem para balançar e justamente não bata) estava arrebentada. Graças à minha infância regada a muitos episódios de MacGyver, consegui fazer uma senhora gambiarra com um amarrador de cabelo e está razoavelmente firme por enquanto.

Não riam. Situações extremas exigem atitudes extremas.

E cá estou, na minha cadeira desconfortável, lavando roupas na minha máquina capenga, contando essa história para vocês. Com um grand finale: resolvi fazer caldinho de feijão. Deixei o feijão de molho de um dia para o outro, como mandam as boas receitas, e na hora de cozinhar, minha panela não pegou pressão.

E a quarentena está só começando.

Sobre o autor

Mayara Godoy

Palestrante de boteco. Internauta estressada. Blogueira frustrada. Sarcástica compulsiva. Corintiana (maloqueira) sofredora. Capricorniana com ascendente em Murphy. Síndrome de Professor Pasquale. Paciente como o Seo Saraiva. Estudiosa de cultura inútil. Internet junkie. Uma lady, só que não. Boca-suja incorrigível. Colunista de opiniões aleatórias. Especialista em nada com coisa nenhuma.

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